A pessoa que não lê, mal fala, mal ouve, mal vê. (Malba Tahan)

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Políticas públicas e as três virtudes a cultivar.

O ano de 2009 foi marcado por uma série de pré-conferências e conferências por todo o país, preconizando um momento impar para a participação social no alinhavo das políticas públicas nos diversos setores de atuação do estado brasileiro. A condução de eventos dessa magnitude exigiu uma organização que desse conta da amplitude de um país como o Brasil, levando em conta os setores participantes de cada um dos encontros e seus temas relativos. À parte as críticas pontuais, dos exageros e dos percalços na movimentação de milhares de pessoas e demandas, o saldo foi de uma participação efetiva naquilo que poderíamos chamar de gestão participativa das políticas públicas no Brasil.

Para quem achar que isso pouco, basta lembrar que somos um país com uma herança autoritária, advinda das estruturas oligárquicas e escravocratas que sobreviveram ao fim do Império e suas mazelas. Mesmo na República, vamos encontrar práticas e discursos referentes à velha e rançosa observação de que as camadas populares incomodam mais do que contribuem nos processos decisórios. Os esforços de eventos dessa natureza e fazer cair por terra tais práticas e discursos. E aqui aparece uma primeira virtude dos participantes deste processo: a paciência. Paciência para lidar com as diferenças, tão ricas neste país marcado pela imigração, pela desigualdade de classes, por matizes autoritárias nas relações de gênero, pela escravidão, mas também pelos esforços de esvaziamento sistemático das pré-conferências e conferências, motivadas pelos setores pouco interessados em mudanças que alterem as zonas de conforto ocupadas há muito tempo. Virtude que mostrou os seus resultados: a maior participação popular da história do país em termos relativos e absolutos. Vamos nos lembrar que no Império e por boa parte da República, a população não participava diretamente das escolhas e das decisões importantes do país. Quadro que os movimentos sociais foram conquistando à duras penas ao longo da história deste país, com sucessos nem sempre duradouros.

A segunda virtude emana de um passo mais efetivo na direção da democracia: a prudência. A prudência para não confiar nos velhos moldes da política no Brasil, feita por representantes desconectados do lugar social que dizem representar, mas bem afinados com os interesses que representam. Os povos indígenas, as mulheres, os homossexuais, os grupos afrodescendentes, as populações ribeirinhas, falaram por si. Política trazida para a participação de cada um como cidadão, independente de sua origem étnica, da posição social, do credo religioso, da opção sexual. Não deixar outros falarem por nós foi um dos pontos positivos das conferências e pré-conferências que ocorreram em praticamente todo o território nacional em pelo menos uma de suas modalidades (Educação, cultura, água e meio ambiente, trânsito, cidades, infância e adolescência, igualdade racial, segurança pública, para dar alguns exemplos).

Por fim, a terceira virtude desses encontros da cidadania foi a persistência, para compreender que muitas vezes é preciso bater várias vezes numa mesma porta. Mas bater com as próprias mãos e com toda a dignidade que as reivindicações exigem. O que em outros tempos era caso de polícia, punido com repressão aos seus atores, virou força política na mesa em que todos os jogadores tinham o mesmo peso. Ao menos lutaram para se fazer ouvir sem medo do silenciamento.

É muito cedo para medir os resultados de toda essa mobilização e deste movimento participativo. Mas que tenhamos como horizonte as virtudes que emanaram deste momento histórico. As mesmas forças que se fizeram presentes ( ou se ausentaram de forma proposital, como na conferência da Comunicação) podem ficar esperando para retomar espeços e posições. Neste sentido, a paciência, a prudência e a persistência não devem ser deixadas de lado pelos atores sociais, já que “ tudo que é sólido, desmancha no ar”.

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